POTICA

POTICA

Orehova potica (potica de nozes) forma redonda e reta

É de um longe um dos alimentos de festa mais conhecidos em toda a Eslovênia e em seus vizinhos limítrofes. As primeiras citações escritas relativas ao que viria a ser a potica, ou seja, sobre um pão, ou inicialmente torta enrolada, datam de 1409, quando a Gubana (torta enrolada) foi servida para o Papa Gregorio XII em sua visita a Cividale, região do Friuli-Venezia Giulia, província de Udine. Seu nome, potica, provavelmente vem da palavra povtica ou povetica, que seriam derivadas do particípio passado do verbo poviti, que significa enrolar (1).

Embora sejam conhecidas como sendo doces, há ainda potica salgada e modernamente com uma variedade de recheios. Chama a atenção para os Brasileiros, a potica recheada com estragão ou em esloveno pehtran, pois essa erva e aqui e em muitos países, especifica para temperar carnes e molhos, como o famoso molho Béarnaise francês. No entanto, pode-se dizer que a mais famosa, ou mais típica, seja a potica de nozes ou Orehova Potica. Embora sua base sejam as nozes e as receitas muito conhecidas, como em outras artes, há uma certa personalização dependendo de quem as prepara. Assim, nas famílias, nos vilarejos, há sempre pessoas de destaque pela potica que fazem. São detalhes da massa, do fermento utilizado, tempo, método e processo de crescimento da massa, tipo de farinha, espessura as camadas, quantidade de recheio, umidade, maciez, cor, forma etc. No recheio, por exemplo, há os que adicionam bolachas tipo de leite trituradas fino, ou farinha de rosca, buscando com isso um recheio mais grosso e denso. Há os que adicionam rum, anis, creme de leite, clara de ovos batidas, mel, e os que usam apenas nozes e açúcar ou mel. É comum nas casas de camponeses mais tradicionais até hoje, ver cestos com fatias de pão amanhecido no beiral de janelas, na parte de dentro, vizinho do vidro, ali colocadas para secar ao sol. Depois podem ser torradas ou simplesmente amassadas por um pau de macarrão para virar a farinha de rosca a ser usada inclusive para incorporar ao recheio de potica. Truques de como cobrir a massa para crescer são também variados, e por aí vai, cada um com sua arte. Quando é inverno, no Natal por exemplo, é comum colocar a massa para crescer dentro de tigelas de barro, enroladas em toalhas ou pequenos cobertores, e colocar sobre a parte superior de algum aquecedor de ambiente. Enfim há todo um ritual para a manutenção da fama de uma boa potica e para a sorte dos comensais, pois quando é bem feita, bem recheada transforma qualquer momento em festa. Para nós, mesmo aqui no Brasil, o aroma de potica assando no ambiente é sinal de festa, de alegria. Não há páscoa nem natal sem esse aroma.

Os imigrantes que para cá vieram para trabalhar no interior do país, na lavoura de café em grande parte, não tinham acesso aos bons empórios da época, abasteciam-se nos pequenos negócios das também pequenas cidades vizinhas das fazendas onde moravam, isso na melhor hipótese, pois do contrário, tinham que se contentar com o oferecido nos pequenos pontos de abastecimentos de víveres dentro da própria fazenda, pagando altos preços para serem descontados em seus baixos salários. Não dispunham, portanto, de nozes. A solução para o recheio da potica era utilizar o amendoim, adoçado com rapadura ralada ou açúcar mascavo, sem bolachas e pães, esses não sobravam a ponto de ficarem secos! Essa receita acabou identificando o que seria a de potica para muitos descendentes de eslovenos que aqui nasceram e vivem, e não tiveram a oportunidade de conhecer a original. Muitos dos descendentes que não falam a língua chamam a potica de pão de amendoim. Em casa, depois que nossos antepassados conseguiram sair da fazenda, nossa família passou a morar na cidade, mas nosso poder aquisitivo não permitia a compra das importadas nozes, também para nós o amendoim era a solução. Mas o aroma de festa era o mesmo, era “cheiro” de Natal, Ano Novo, Casamentos e outros. Como não eram frequentes, nós crianças costumávamos comer calmamente para durar mais tempo, desenrolando cada espiral da nossa fatia e comendo em pequenos pedaços.

Receita

Essa receita é fruto de adaptações e constantes melhorias, notadamente no processo de produção, sempre feito por minha esposa Alais Vidrik que a prepara para todos nossos eventos familiares. Serviram como fonte primária meus pais, Olga e Luiz Vidrih, a partir do que aprenderam com nossa avó Johanna. Depois vieram nossa experiência com nossos parentes em Belsko, e, mais recentemente, foram agregadas contribuições oriundas dos livros e comentários elogiosos do professor Janez Bogataj após degustação de nossa potica. Não podemos esquecer ainda, a colaboração da prima do Sr. Martin Crnugelj, a Sra. Jožica Kifnar de Ljubljana, que nos presenteou com uma receita manuscrita cuidadosamente detalhada. Mesmo assim, possivelmente, cada um dos leitores experientes terá, à sua maneira, algo a comentar, acrescentar, tirar, enfim modificar. Portanto, que não seja entendido o que aqui apresentamos com sendo “a receita”, mas sim, apenas, como a usada em casa.

Massa

  • 1kg de farinha de trigo
  • 3 colheres de sopa de leite morno (apenas para diluir o fermento)
  • 1 colher de chá de açúcar (apenas para diluir o fermento)
  • 20 gramas de fermento biológico (para pão)
  • 400 ml de leite morno
  • 100 gramas de manteiga
  • 2 a 3 colheres de sopa de açúcar
  • 1 colher de chá de sal
  • 8 gemas

Recheio

  • 1 kg de nozes trituradas (costumamos triturar cerca de 70% mais fino, e o resto, 30%, deixamos mais grosso, do tamanho, por exemplo, de um amendoim. Isso dá mais crocância à potica.
  • 300 gramas de açúcar ou mel (essas quantidades podem ser aumentadas ou diminuídas de acordo com o gosto)
  • 100 ml de leite ou 1 caixinha de creme de leite
  • 2 envelopes de açúcar com baunilha (pode-se colocar extrato de baunilha a gosto) – isso é opcional.
  • Raspa de um limão siciliano
  • Canela em pó quanto baste
  • Claras (dos oito ovos) batidas em neve
  • 2 colheres de sopa de Rum (também pode variar de acordo com o gosto)
  • 120 gramas de manteiga (será usada para espalhar sobre a massa aberta antes de espalhar o recheio)

Misturar em uma vasilha grande as nozes moídas, o açúcar ou mel, 100 ml de leite, o açúcar com baunilha, a raspa de limão, o rum e as claras de ovos batidas em neve. Essas devem ser incorporadas, misturadas ao recheio lentamente para não perderem a aeração.

Preparo da massa

Colocar em uma vasilha pequena o fermento, 1 colher de chá de açúcar, 3 colheres de sopa de leite morno. Diluir bem o fermento nessa mistura e deixar repousar por cerca de 10 minutos. Isso serve para “acordar” o fermento que estava resfriado ou congelado.

Após esse tempo, colocar em uma vasilha maior 750 gramas de farinha (o restante da farinha serve para ajudar no preparo), a manteiga, 2 ou 3 colheres de sopa de açúcar, 1 colher de chá de sal, 8 gemas e o fermento anteriormente preparado. Misture bem e vá acrescentando os 400 ml de leite morno até que a massa desgrude da mão e possa ser trabalhada. Faça uma bola com a massa e coloque para crescer em uma vasilha envolta com um pano grosso, as vezes um pequeno cobertor. A ideia e manter a massa aquecida o maior tempo possível.

Após cerca de 30 a 40 minutos a massa deve ter duplicado de tamanho, colocar sobre uma mesa abrir com as mãos ou rolo.

Modo de rechear

Após abrir a massa e deixá-la com cerca de 8 a 10 milímetros de espessura, pincelar sobre ela a manteiga (120 gramas) listada no recheio, derretida, mas não muito quente. Em seguida, espalhar o resto dos ingredientes do recheio já misturados em uma camada uniforme. Enrolar e deixar descansar por mais 30 minutos. Depois de enrolada, colocar na forma e fazer alguns furos na potica de cima até o fundo, usando para isso um palitinho de churrasco, para facilitar a saída de vapor e evitar a formação de bolhas entre as camadas. Finalmente, pincelar com ovos batidos e colocar no forno em fogo médio (180 a 200 graus) por cerca de 50 minutos, reduzindo depois para fogo baixo (120graus) por mais meia hora. Tirar do forno e pulverizar com açúcar de confeiteiro.

Faz parte do texto sobre a Gastronomia de Páscoa Eslovena


(1) Fonte: Livro – Potice Iz Slovenije. Autor Janez Boagataj. Editora Rokus Klet, Ljubljana, 2013.

Elaborado por Valdeir R. Vidrih, professor universitário Esloveno-Brasileiro, “artisan Charcutier”, descendente de família de mestres charcuteiros eslovenos, recebeu duas vezes diploma de reconhecimento e agradecimento da Embaixada da Eslovênia no Brasil por sua colaboração na divulgação da Cultura Gastronômica Eslovena, é autor de livro: A Arte de Fazer Embutidos e Defumados: a tradição de uma família Eslovena. Editora Canal 6. Bauru, 2 edição, 2018.

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Uma resposta para POTICA

  1. ANDREA MAGNA UDENAL disse:

    Bom dia!!!

    Meu Deus, estou impressionada com essa receita pois minha avó aprendeu com a sogra Johanna Bastionick, até o nome é igual de minha bisavó que veio não sabemos ao certo de Postojna ou Liubliana, filha de Martin Geli e Francisca Bastionick , nascida em 1871 .
    Ela fazia esta receita nas festas de Páscoa e Natal e que perfume exalava.
    Nossa avó dizia que o nome era Potitiza.

    Que lindo, fico muito emocionada.

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